A advocacia é uma das profissões mais antigas. Nenhuma outra profissão jamais se mostrou tão polêmica, ora ela é exaltada, ora é odiada, conforme as circunstâncias. O caso do acusado que foi defendido por Evaristo de Morais certamente foi um daqueles em que o advogado é visto como um criminoso mercenário.
Muitas vezes a sociedade vê a
advocacia como amoral, e sustentam a indefensibilidade de certas causas.
Esquecem que para o direito não há causas indignas de defesa, uma vez que todos
têm direito a um advogado, independente de ser inocente ou culpado. Sendo
culpado o acusado, tem, no mínimo, o direito a regularidade processual, a ser
vigiada por seu defensor.
Um advogado não pode deixar de
aceitar uma causa em razão de clamor público ou da violência do crime praticado,
fazendo isso, ele estará ignorando ou até mesmo traindo as leis próprias da sua
profissão. A carta resposta de Rui Barbosa é o retrato mais fiel do papel do
advogado, o de ser a voz do direito, a voz dos direitos legais do acusado que
não pode calar diante da paixão pública. Não é a toa que os seus ensinamentos
são seguidos até hoje, e que Evaristo de Morais conseguiu a absolvição, por três
vezes seguidas, do seu cliente.
O advogado tem, no exercício da profissão, deveres pessoais, deveres para
com os tribunais, deveres para com os colegas e deveres para com os clientes.
Esses deveres estão regulados no Código de Ética e Disciplina da OAB. O
parágrafo único do artigo 33 do referido diploma legal dispõe que o advogado
tem, ainda, deveres para com a comunidade, a publicidade, o dever geral de
urbanidade e o dever de assistência jurídica.
Além dos regulados pelo Código de Ética e Disciplina da OAB, existem os
deveres dispostos no Estatuto da Advocacia (Lei 8.906/1994).
Aqui nos interessa especialmente o
dever do advogado de atuar com destemor, mesmo em meio a revoltas populares,
independentemente do crime que o acusado tenha cometido, e o dever de
assistência jurídica. Sobre o assunto nos cala a voz de Rui Barbosa:
Ora, quando quer e como quer
que se cometa um atentado, a ordem legal se manifesta necessariamente por duas
exigências, a acusação e a defesa, das quais a segunda, por mais execrando que
seja o delito, não é menos especial à satisfação da moralidade pública do que a
primeira. A defesa não quer o panegírico da culpa, ou do culpado. Sua função
consiste em ser, ao lado do acusado, inocente, ou criminoso, a voz dos seus
direitos legais.
Se a enormidade da infração
reveste caracteres tais, que o sentimento geral recue horrorizado, ou se levante
contra ela em violenta revolta, nem por isto essa voz deve emudecer. Voz do
Direito no meio da paixão pública, tão susceptível de se demasiar, às vezes pela
própria exaltação da sua nobreza, tem a missão sagrada, nesses casos, de não
consentir que a indignação degenere em ferocidade e a expiação jurídica em
extermínio cruel. pp 36
OS DIREITOS DO
ACUSADO:
Tão importantes quanto os deveres do advogado, são os direitos do
acusado. Em muitos casos, os direitos do acusado é que levam a um determinado
dever do advogado. Por exemplo, o acusado tem o direito a defesa, o advogado tem
o dever a assistência jurídica.
O advogado é indispensável à administração da justiça, é defensor do
estado democrático de direito, da cidadania, da moralidade pública, da Justiça e
da paz social, e deve ter a consciência de que o Direito é um meio de mitigar as
desigualdades, e que a lei é um instrumento para garantir a igualdade de todos.
Diz os artigos 2º, caput, e 3º do Código de Ética e Disciplina da OAB. Pois bem,
o acusado também não é um cidadão que está sob a regência do estado democrático
de direito e ele não deve ser igual perante a lei? Claro que
sim.
Ao defender o particular, o advogado
está também defendendo a ordem jurídica, ou seja, está defendendo a justiça,
pois é justo que o acusado tenha direito à defesa. Segundo Rui Barbosa:
“Eis por que, seja quem for o acusado,
e por mais horrenda que seja a acusação, o patrocínio do advogado, assim
entendido e exercido assim, terá foros de meritório, e se recomendará como útil
à sociedade.”
Diz ainda o ilustre
Mestre:
Recuar ante a objeção de que o
acusado é “indigno de defesa”, era o que não poderia fazer o meu douto colega,
sem ignorar as leis do seu ofício, ou traí-las. Tratando-se de um acusado em
matéria criminal, não há causa em absoluto indigna de defesa.
Ainda quando o crime seja de todos o mais nefando, resta verificar a prova: e
ainda quando a prova inicial seja decisiva, falta, não só apurá-la no cadinho
dos debates judiciais, senão também vigiar pela regularidade estrita do processo
nas suas mínimas formas. Cada uma delas constitui uma garantia, maior ou menor,
da liquidação da verdade, cujo interesse em todas se deve acatar rigorosamente.
pp 39.
CONCLUSÃO:
Diante de tudo que foi exposto, fica
evidente o dever do advogado de não temer em aceitar o patrocínio de causas
consideradas “injustas”, “imorais”, “indignas de defesa”, pois para o Direito
não existem esse tipo de causa, uma vez que diante da nossa Constituição Federal
todos têm direito a defesa.
Além disso, o próprio direito natural nos
leva a essa conclusão, vez que todos nos sabemos que pessoas são condenadas
injustamente por crimes que não cometeram, muitas vezes antecipadamente pela
mídia, em razão do clamor da paixão pública. E mesmo que o acusado seja culpado,
já passamos da época do “olho por olho, dente por dente”, e a história mostra
que a vingança jamais foi eficaz. A justiça deve ser feita, a vingança não.
O acusado deve ter a chance de se defender,
e sendo culpado deve ser punido na medida de sua culpabilidade e atendendo aos
seus direitos legais, sendo o advogado de fundamental importância para
isso. REFERÊNCIAS:
BARBOSA, Rui. O dever do advogado. Rio de
Janeiro: Edições Casa de Rui Barbosa, 2002. 3ª ed.
CORTEZ, Alexandre Tavares. Responsabilidade civil do
advogado. Jus
Navigandi, Teresina, ano 9, n. 768, 11 ago. 2005. Disponível em: . Acesso em: 24 de abril de
2010.
Nenhum comentário:
Postar um comentário